r7 -02/10/2021 16:50
Os casos de "Covid
longa", que deixam o paciente com os sintomas da doença durante meses,
começam a ser mais bem definidos, mas, mesmo assim, persistem dúvidas sobre sua
real natureza.
"Devemos pesquisar mais a Covid longa e os pacientes
afetados", declarou no fim de setembro a médica suíça Myssam Nehme,
durante uma conferência organizada pelo Instituto Pasteur.
Como outros cientistas, Nehme trabalha para definir melhor a
realidade da Covid de longa duração, ou seja, a persistência de sintomas em um
paciente que foi diagnosticado meses antes com a doença.
No ano passado, pouco depois do início da crise sanitária,
vários pacientes afirmaram que muito tempo depois da infecção continuavam
sofrendo alguns de seus sintomas, como cansaço, dificuldade para respirar ou
perda de olfato.
Atualmente, a existência do fenômeno gera consenso. Muitos
cientistas e várias autoridades da área de saúde reconhecem que algumas pessoas
sofrem sintomas duradouros da doença, e não apenas as que tiveram a forma grave
da Covid.
Myssam Nehme calcula, após um estudo com centenas de
pacientes, que mais de um terço continua apresentando ao menos um sintoma da
enfermidade sete, oito ou nove meses depois.
Mas isso é apenas um ponto de partida. Não se sabe o que
pode provocar a persistência dos sintomas: resta uma pequena quantidade de
vírus no organismo? Os órgãos são afetados, seja pelo vírus, seja pela resposta
imunológica? Existe um componente puramente psicológico?
As dúvidas sobre as causas levam a outra pergunta. Existe
uma única Covid longa? Ou estão sendo classificadas sob um mesmo termo
realidades muito diferentes, entre pacientes afetados por formas leves da Covid
e outros que sofreram complicações, a ponto de serem hospitalizados ou
internados no CTI?
"A Covid longa significa agora coisas diferentes em
contextos diferentes e para pessoas diferentes", escreveu em agosto o
pneumologista americano Adam Gaffney em um artigo no jornal New York Times.
Gaffney, que não nega a necessidade de levar a sério todo
paciente com sintomas de longa duração, teme uma forma de alarmismo dos meios
de comunicação. Diante da diversidade de casos qualificados como Covid longa,
ele expressa dúvidas sobre a existência de uma patologia ligada apenas à
infecção pelo coronavírus.
Nas últimas semanas, porém, vários estudos - como o da
doutora Nehme - se concentram nas especificidades da covid. Ao contrário das
pesquisas realizadas rapidamente no início da pandemia, os estudos atuais
comparam a frequência dos sintomas com pacientes que não ficaram doentes ou que
contraíram outras patologias.
Esse é o caso de um estudo publicado no fim de setembro na
revista PLOS One por uma equipe britânica. A partir dos dados compilados com
quase 300.000 pacientes, a pesquisa destaca que os sintomas típicos da Covid
longa são mais frequentes em pessoas que sofreram de Covid-19 do que naquelas
que passaram pela gripe sazonal.
"Isso leva a pensar que sua origem poderia estar
parcialmente vinculada a uma infecção de SARS-Cov-2", afirma o estudo.
Mas é muito difícil tirar conclusões porque o estudo
constata uma grande diversidade de sintomas, com base na gravidade da doença e
na idade dos pacientes.
E, nesse sentido, até que ponto as crianças estão ameaçadas
por uma Covid longa?
A resposta pode influenciar a abordagem da vacinação entre
os mais jovens, que praticamente não correm nenhum risco de desenvolver uma
forma grave de Covid-19, mas uma forma longa da doença que, sim, pode ser
prejudicial.
Mas inclusive nesse ponto alguns cientistas alertam que não
se deve cair no alarmismo. Uma meta-análise publicada no fim de setembro na
revista Pediatric Infections Disease Journal, baseada em 15 estudos prévios,
considera que estes últimos são muitas vezes tendenciosos e aumentam a
frequência de casos de Covid longa entre os mais jovens.
"O risco real provavelmente está muito mais próximo de
um para cada 100 do que de um para cada sete, uma proporção muito
utilizada", escreveu no Twitter um dos principais autores da análise, o
cientista e pediatra Nigel Curtis.
Curtis lembrou, porém, que por menor que a proporção de um
para cada 100 possa parecer ela ainda representa muitos casos e, por isso, é
necessário estudar bem como tratá-los.