metsul/com -20/12/2021 09:22
A NOAA, Administração Nacional de Oceanos e Atmosfera dos
Estados Unidos, acaba de liberar o seu mais recente relatório sobre o estado do
campo magnético do planeta Terra, valendo-se de dados do seu World Magnetic Model
2020 (WMM2020) e de um modelo mais recente a partir de dados coletados pelos
satélites Swarm da Agência Espacial Europeia (ESA) até setembro de 2021.
De acordo com a NOAA, as mudanças não lineares no campo
magnético da Terra permaneceram pequenas nos últimos dois anos. Desde a 2020, o
pólo magnético Norte (respectivamente Sul) moveu-se a uma velocidade média de
44 km/ano e sem qualquer mudança perceptível na direção. Tais movimentos
levaram a pequenas mudanças na forma e localização das zonas de blecaute (WMM),
onde a precisão da bússola é menor.
A Anomalia do Atlântico Sul, onde a intensidade do campo
geomagnético é menor, continuou a aumentar, em cerca de 50 nT ao nível do mar,
e a se mover para o Oeste com seu centro deslocado por cerca de 50 quilômetros
ao nível do mar em direção à América do Sul.
Ao contrário de Mercúrio, Vênus e Marte, a Terra é cercada
por um imenso campo magnético chamado magnetosfera. Gerada por forças dinâmicas
e poderosas no centro de nosso mundo, a magnetosfera nos protege da erosão de
nossa atmosfera pelo vento solar (partículas carregadas que nosso Sol lança
continuamente), erosão e radiação de partículas de ejeções de massa coronal
(nuvens massivas de energia e plasma solar magnetizado e radiação), e raios
cósmicos do espaço profundo.
A magnetosfera desempenha o papel de guardiã, repelindo essa
energia indesejada que é prejudicial à vida na Terra, mantendo a maior parte
dela a uma distância segura da superfície da Terra em zonas gêmeas em forma de
rosca chamadas de cinturões de Van Allen. O que mais chama atenção responde
pela sigla AMAS que significa Anomalia Magnética do Atlântico Sul.
Trata-se de um fenômeno que ainda é um mistério para a ciência e que não raro nas redes sociais alguém questiona se não estaria interferindo no clima do Brasil e da América do Sul, apesar de não haver evidência alguma até o momento.
A AMAS, que está crescendo e com seu centro mais perto da
América do Sul, é uma espécie de defasagem na proteção magnética da Terra
localizada sobre o Atlântico Sul, mais especificamente nas regiões Sul e
Sudeste do Brasil, em faixa que se estende até a África. Mas, como este déficit
de blindagem bem acima do Atlântico Sul pode afetar a vida no nosso planeta?
Uma consequência que já compreendemos é na atuação dos
satélites que estão na órbita da Terra. Ao passarem pela região com baixa na
retaguarda de proteção, eles podem apresentar avarias causadas pelo fluxo de
radiação cósmica. Por isso, a anomalia é monitorada por agências espaciais como
a ESA e a NASA, e mais recentemente pelo Brasil, que lançou ao espaço o
nanossatélite NanosatC-BR2 com esta missão.
É o que explicou à Agência Brasil o doutor em Física,
pesquisador do Observatório Nacional, Marcel Nogueira. ”Por que as agências
espaciais tem interesse na anomalia? Porque como essa região tem um campo mais
enfraquecido, as partículas do vento solar adentram nessa região com mais
facilidade, o fluxo de partículas carregadas que passam por aquela região é
muito mais intenso”, explica Nogueira.
“Isso faz com que os satélites quando passam por essa
região, eles tenham que, por vezes, ficar em stand by, desligar momentaneamente
alguns componentes para evitar a perda do satélite, de algum equipamento que
venha a queimar. Porque a radiação, principalmente elétrons, nessa região é
muito forte. Então é de interesse das agências espaciais monitorarem
constantemente a evolução desta anomalia, principalmente nesta faixa central”,
complementa.
Imagine um dia sem internet, celular, GPS ou meios de
comunicação? Se o fenômeno afeta os satélites que são responsáveis por sistemas
de comunicação e geoposicionamento, então ele pode afetar a nossa vida tão
tecnológica.
“Se gente estuda as tempestades também, temos condições de
melhorar o nosso sistema de distribuição de energia elétrica e protegendo,
evitando esses blecautes. Porque na vida cotidiana que a gente tem hoje em dia,
tão dependente da tecnologia, qualquer tipo de apagão no sistema elétrico, de
qualquer país, gera prejuízo de milhões ou até bilhões de dólares. É algo muito
importante para nossa vida tecnológica hoje em dia.”, diz o pesquisador.
No Brasil, além do nanossatélite lançado ao espaço em uma
parceria com a agência espacial da Rússia, também há dois observatórios
magnéticos que, entre outras missões, estão focados em responder
questionamentos sobre esta anomalia: Vassouras, no Rio de Janeiro, e Tatuoca,
na região amazônica. Ambos fazem parte da Rede Global de Observatórios
Magnéticos, o Intermagnet.
A falta de conclusões desperta curiosidade sobre a Anomalia
do Atlântico Sul. Por isso é que ela acaba sendo popularmente associada a
eventos como os já registrados no Triângulo das Bermudas. Mas, Marcel prefere
dizer que o fenômeno é muito mais um desafio tecnológico e que não há
conclusões que apontem para os riscos do fluxo das radiações cósmicas na vida
humana.