estadao conteudo -25/09/2020 14:13
Quando uma vacina segura e eficaz contra a Covid-19 estiver
disponível à população, é provável que apenas os adultos sejam imunizados
primeiro. As crianças, grupo de menor risco para o novo coronavírus, entraram
há pouco tempo em testes clínicos pontuais – dos quatro autorizados pela
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), apenas um engloba pessoas a
partir de 16 anos. Por isso, especialistas ouvidos pelo Estadão afirmam
que poderá levar meses para que crianças e adolescentes sejam vacinados. Há
quem diga que o imunizante para eles possa chegar somente depois de 2021.
No Brasil, entre os testes clínicos autorizados, o que
engloba participantes mais jovens é o produzido pela Pfizer com a BioNTech, que
vai avaliar o produto em adolescentes a partir dos 16 anos e adultos. Já a
vacina da Universidade de Oxford e da AstraZeneca incluiu idosos e crianças de
5 a 12 anos nos testes de fase 2 apenas no Reino Unido. Aqui, a farmacêutica
informou que “a prioridade atual é reunir evidências sobre o potencial da
vacina para proteger as populações mais vulneráveis a resultados graves”.
“A inscrição de crianças começará assim que dados
suficientes forem reunidos em adultos, indicando que a AZD1222 tem potencial
para ser segurae protetora em crianças”, disse a empresa. O mesmo caminho vai
seguir o Instituto Butantã, que tem feito testes no País de um imunizante da
chinesa Sinovac. O centro de pesquisa brasileiro vai aguardar os resultados de
estudos clínicos em 552 voluntários saudáveis com idade entre 3 e 17 anos na
China, que devem começar este mês. Só depois será definido se e como as
crianças serão incluídas aqui.
No caso da vacina produzida pela Johnson&Johnson, também
no Brasil, o estudo clínico de fase 3, cujo início foi anunciado quarta-feira,
vai avaliar a segurança e a eficácia do produto em cerca de 60 mil adultos com
idades acima de 18 anos. Ainda não há informações sobre a inclusão de crianças
nos testes.
Pensar em uma vacina para esse público exige certo cuidado,
porque crianças não são simplesmente adultos em miniatura. Elas podem ter
resposta imunológica diferente dos mais velhos e precisar de doses diferentes
também. Especialistas afirmam que, no caso do imunizante contra a covid-19, os
dados epidemiológicos e os primeiros achados sobre os impactos da doença
nortearam as pesquisas. Desse modo, o foco está nos grupos com mais risco de
complicações, situação que não contempla as crianças.
“Em geral, essas fases de pesquisa focam nos grupos mais
vulneráveis para determinada doença, mas, para chegar ao grupo, a pesquisa
precisa de dados epidemiológicos que vão guiar para faixas etárias. Para covid,
epidemiologicamente, são os idosos e profissionais da saúde, mas, na primeira
fase, que tem abordagem inicial para avaliar a segurança e eficácia, os voluntários
são adultos, jovens e saudáveis”, explica Juarez Cunha, presidente da Sociedade
Brasileira de Imunizações (SBIm).
Isso não quer dizer, porém, que os estudos com crianças não
devam ser realizados. “É importante ter braços de pesquisa que apliquem nas
crianças. Esta é uma doença nova. Com o retorno às aulas e a mobilidade,
podemos ver o que não vimos com as crianças fora da escola.”
Para Renato Kfouri, presidente do Departamento de
Imunizações da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), a imunização das
crianças pode demorar. “As crianças não serão prioridade porque não adoecem com
mais gravidade do que outros grupos e não transmitem com mais frequência.”
Em nota, o Ministério da Saúde informou que os grupos
prioritários para vacinação contra a covid-19 estão sendo estudados pelo
Programa Nacional de Imunizações (PNI). A Anvisa informou que ainda não recebeu
pedido de autorização para estudos clínicos em crianças