r7 -15/08/2021 17:42
O ritmo
acelerado da vacinação no Brasil e a consequente queda de casos e
mortes por covid-19 têm, aos poucos, incentivado setores
da economia e do governo que haviam adotado o home office a antecipar
ou planejar o retorno presencial às atividades. Na maioria dos casos, o
funcionário deve comprovar que completou o esquema vacinal. Apenas
trabalhadores com contraindicação médica têm sido orientados a manter o
teletrabalho.
Em São Paulo, o governo
do estado determinou o retorno ao trabalho presencial de todos os servidores da
administração pública direta e autárquica – um total de 572 mil
pessoas. Estão fora da regra os profissionais que apresentarem fatores de risco
ou que ainda não tenham sido imunizados contra a covid.
Os servidores paulistas enquadrados nas exceções, segundo o
governo, estão sendo mantidos em jornada remota de trabalho, ou à disposição da
administração pública até que tenham tomado a segunda dose da vacina.
Universidades públicas
A determinação vai valer também para as três
universidades estaduais paulistas (Universidade de São Paulo/USP, Universidade
Estadual de Campinas/Unicamp e Universidade Estadual Paulista/Unesp), que
já anunciaram que vão exigir a vacinação completa de seus professores, alunos e
funcionários para a volta presencial neste segundo semestre.
Na USP, as aulas presenciais serão retomadas em 4 de outubro
apenas para estudantes imunizados contra a covid-19 com as duas doses. As
condições serão as mesmas na Unicamp e na Unesp, onde a previsão é voltar aos
campi a partir de setembro.
Já a Prefeitura de São Paulo informou que os servidores
do grupo de risco já vacinados (14 dias após as doses preconizadas para a
vacina) não serão mais submetidos de forma obrigatória ao home office pelas
chefias imediatas. No entanto, a Secretaria Municipal de Gestão esclareceu
que a decisão sobre permanecer em teletrabalho ou voltar ao presencial cabe a
cada órgão ou secretaria.
Na semana passada, a Prefeitura
tornou obrigatória a vacinação contra covid-19 para todos os servidores e
funcionários públicos municipais da administração direta, indireta,
autarquias e fundações de São Paulo. Segundo a Prefeitura, a recusa, sem justa
causa médica, será considerada falta grave e poderá resultar em punições.
Iniciativa privada
No setor privado, muitos segmentos também ensaiam o retorno.
Um dos mais importantes bancos do país, o Bradesco informou que se prepara para
uma “retomada segura e de forma planejada”, sempre respeitando os protocolos
sanitários e as diretrizes do governo. De olho na evolução da vacinação no
Brasil, o banco prevê um retorno gradual entre a segunda quinzena de setembro e
a primeira de outubro.
Segundo o Bradesco, embora o retorno esteja planejado para
ocorrer de forma faseada, “o modelo de trabalho híbrido é uma realidade”. O
banco destaca o cuidado com a saúde do seu quadro de funcionários,
colaboradores e familiares, mas não esclareceu se a volta ao trabalho
presencial será condicionada à vacinação contra a covid. “Isso ainda está sendo
definido”, informou a assessoria do Bradesco.
Pesquisas internas
Para os especialistas, o retorno gradual e faseado, modelo
escolhido pelo Bradesco, é o mais seguro neste momento, uma vez que ainda
vivemos numa pandemia. “Antes da volta, é importante ouvir as pessoas.
Pesquisas internas podem revelar quem está no grupo de risco, quem tem medo de
abandonar o home office e quem quer voltar ao trabalho presencial” explica
Mariane Guerra, vice-presidente de Recursos Humanos da ADP na América Latina.
Os resultados da pesquisa, segundo Mariane, vão ajudar a
nortear as primeiras ações da empresa, apontando, por exemplo, quais grupos
devem voltar primeiro. “Uma transição suave, com a volta gradativa dos
funcionários, é mais indicada”, diz. Evidentemente, o espaço físico da
organização precisa estar preparado para receber os trabalhadores. “Todos os
protocolos sanitários precisam ser seguidos. Outra conduta recomendada é
realizar testagens por amostra regularmente.”
A obrigatoriedade da vacinação entre os funcionários é um
fator que deve ser avaliado com cuidado por cada empresa. “Num primeiro
momento, o ideal é sensibilizar o trabalhador, explicar os riscos à própria
saúde, dos colegas e familiares”, afirma a executiva de RH. “Afinal, se o
empresário permite o retorno de um funcionário não imunizado, coloca em risco
todos os demais. E não se pode esquecer que ele tem uma responsabilidade sobre
a coletividade”, argumenta.
Interesse coletivo
O advogado Luiz Eduardo Amaral de Mendonça, especialista em
direito do trabalho e sócio do FAS Advogados, concorda com Mariane. Ele lembra
que o STF
(Supremo Tribunal Federal) decidiu em plenário, em dezembro, que o Estado pode
impor, àqueles que se recusam a ser imunizados, medidas restritivas previstas
em lei. “O ministro (Luís Roberto) Barroso deixou claro, em seu voto, que o
interesse individual, ao esbarrar no interesse de terceiros, perde poder em
benefício da coletividade”, afirma.
Baseado nas decisões restritivas autorizadas pelo Supremo,
projeto de lei apresentado à Assembleia Legislativa do Paraná prevê que
cidadãos não imunizados contra a covid sejam proibidos de se matricular em
escolas públicas ou particulares, participar de concursos públicos e até
embarcar em ônibus, trens e aeronaves. Proposta semelhante tramita no Senado
Federal e torna obrigatória a vacinação para aqueles que precisem de
atendimento presencial em estabelecimentos públicos e privados passíveis de
aglomeração.
Demissão por justa causa
Nesse sentido, a conduta não poderia ser diferente na
iniciativa privada. “A empresa
que vai retomar o trabalho presencial pode e deve exigir a vacinação de seus
funcionários para garantir um ambiente saudável e seguro para todos”,
explica Mendonça. Prevalece, nesse caso, a orientação do Ministério Público do
Trabalho, que prevê a possibilidade de demissão por justa causa nos casos de
recusa à imunização, após esgotadas todas as tentativas de conscientização. A
única exceção é se houver motivo clínico para a recusa, com razões médicas
documentadas.
O especialista afirma que, se uma empresa pode ser
responsabilizada legalmente pela eventual contaminação por covid de um
funcionário em suas dependências, a lei permite a essa empresa que exija a
vacinação de seus empregados. “Para isso, é claro que a organização precisa
adotar todas as medidas de prevenção e protocolos sanitários”, diz Mendonça.
“A orientação sobre a importância da vacinação também é
fundamental”, afirma o advogado. “E vale a pena fazer uma análise de todas as
funções e verificar situações em que o teletrabalho pode ser mantido." Se
não for possível, e houver a recusa de imunização, o funcionário pode ser
advertido e depois suspenso. “A demissão deve ser a última medida.”
LGPD
Segundo Mendonça, as empresas também precisam estar atentas
à LGPD
(Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais). “A informação sobre estar ou não
vacinado é um dado sensível. Quem deve coletar essa informação do funcionário é
sempre o médico do trabalho, que tem o dever do sigilo”, afirma. “Além disso,
ele deve esclarecer a finalidade de sua consulta, ou seja, o planejamento do
retorno presencial, se for este o caso.”