folhapress -10/09/2024 18:13
Com a qualidade do ar cada vez pior e sem perspectiva de
melhora, especialistas recomendam adaptar a rotina para evitar ao máximo a
exposição à poluição e ao sol, principalmente nos períodos de calor mais
intenso e de umidade mais baixa.
"Além das proteções mecânicas -ou seja, boné, chapéu-
contra os raios ultravioletas, tem que levar a garrafinha de água e se
programar. Se tiver que fazer uma caminhada de 500 metros, fracione. Desça [do
ônibus] o mais próximo possível. Se pegar o metrô, ande uma estação a mais.
Infelizmente, nós vamos ter que nos adaptar", afirma Agnaldo Piscopo,
diretor da Socesp (Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo).
Quanto às crianças, além da atenção com as caminhadas, vale
o cuidado no carro. O ideal é não deixá-las por muito tempo dentro do veículo
enquanto espera alguém. Pare próximo ao destino e se o automóvel não tiver ar
condicionado, abra todos os vidros. Os idosos necessitam das mesmas precauções.
As consequências são mais graves nos extremos das idades.
A fumaça das queimadas que se espalha pelo país, a poluição,
o forte calor e a umidade relativa do ar muito abaixo do preconizado pela OMS
(Organização Mundial da Saúde), de 60%, trazem consequências danosas ao corpo,
principalmente coração e sistema respiratório. Aumentam o risco de ataque
cardíaco, AVC (acidente vascular cerebral), arritmias, infecções, agravam
problemas na garganta, doenças respiratórias, alérgicas, e crônicas, entre
outras condições.
Segundo a Federação Mundial do Coração, cerca de 20% das
mortes por doenças cardiovasculares têm relação ou são causadas pela poluição.
A poluição do ar é formada por uma mistura complexa e
dinâmica de numerosos compostos na forma gasosa e particulada, impulsionados
por variadas fontes, e está sujeita à transformação da atmosfera, do espaço e
do tempo. Os três principais poluentes que são focos de programas de
monitoramento e esforços regulatórios são o material particulado, ozônio e
dióxido de nitrogênio.
Evidências sugerem que o material particulado é responsável
pela maior parte do impacto em doenças cardiovasculares, enquanto o ozônio e o
dióxido de nitrogênio estão associados principalmente à exacerbação de doenças
respiratórias.
"A situação do ar está muito grave e nós temos uma
grande preocupação com as consequências a médio e longo prazos, porque a
poluição atmosférica se soma ao excesso de falta de umidade. Tem áreas do
Brasil que estão com umidade semelhante a do deserto do Saara", diz a
presidente da SBPT (Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia, Margareth
Dalcolmo.
"Pessoas com asma, bronquite crônica e enfisema
pulmonar vão sofrer. Muita gente tem me perguntado sobre andar de máscara.
Colocar uma máscara ajuda, se for de boa qualidade, como as N95, mas tudo é
questionável, porque não temos comprovação do quanto elas podem proteger",
ressalta.
Em pessoas mais vulneráveis, com comorbidades, a presença
dos poluentes é um fator somatório, porque já há uma dificuldade instalada. De
acordo com o cardiologista, pode culminar com um gatilho a mais para doença
cardiovascular aguda, principalmente o infarto agudo, e para as doenças e
alterações mais simples que podem se agravar, como desmaios, síncopes e
arritmias. "Há indícios na literatura médica que esses poluentes pioram a
vida das pessoas a curto e médio prazo", comenta o cardiologista.
O clima desértico favorece, ainda, quadros de desidratação
-um alerta principalmente aos idosos que sentem menos sede, bebem pouca água e tomam
remédios contra a hipertensão.
"Acabei de receber uma paciente que chegou com a
pressão de 8 por 4 e toma cinco anti-hipertensivos. Com essa secura, ela não se
hidratou e chegou com a frequência cardíaca baixa, teve um desmaio e uma piora
do déficit serológico. Então, diminuir a pressão por falta de hidratação, e se
ainda toma diurético, causa o efeito indesejado. E um conselho importante: quem
está com múltiplos medicamentos, nessa fase de tanta secura, calor e qualidade
ruim do ar, vale a pena buscar um aconselhamento médico para reajuste das
medicações, se não estiver bem", orienta o especialista.
A quantidade de idas ao banheiro para urinar -quatro ou
cinco vezes por dia é normal no caso de um adulto- e a cor do xixi podem
sugerir desidratação. É o caso da urina escura, concentrada e com cheiro forte.
As pessoas que trabalham na rua, como pintor, pedreiro e
carteiro, por exemplo, devem se hidratar mais, em relação a quem não se expõe
tanto ao ar insalubre, além de ficar atentos à perda de água. "Talvez os
trabalhadores expostos vão ter que trabalhar à noite e não mais de dia nessa
época do ano", diz Piscopo.
A desidratação deixa o sangue mais grosso, provoca queda da
pressão arterial, distúrbios eletrolíticos e vasodilatação. Nos casos mais
graves, evolui para crises compulsivas, parada cardíaca e morte.