agencia brasil -23/06/2024 14:36
Um grupo de pesquisadores da Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ) investigou a reação tardia do vírus da zika e como isso pode
levar a novos episódios de sintomas neurológicos da doença, como crises
convulsivas. Os resultados do estudo inédito estão em um artigo científico
publicado nesta semana no periódico iScience, do grupo Cell Press.
O estudo foi realizado durante quatro anos com cerca de 200
camundongos que se recuperaram da infecção pelo vírus zika. A pesquisa foi
liderada pelas cientistas Julia Clarke, do Instituto de Ciências Biomédicas, e
Claudia Figueiredo, da Faculdade de Farmácia, ambas da UFRJ.
Os resultados apontam que em situações de queda na
imunidade, como stress, tratamento com medicamentos imunossupressores ou
durante infecções por outros vírus, o zika pode voltar a se replicar no cérebro
e em outros locais onde antes não era encontrado, como nos testículos.
“Alguns vírus podem “adormecer” em determinados tecidos do
corpo e depois “acordar” para se replicar novamente, produzindo novas
partículas infecciosas. Isso pode levar a novos episódios de sintomas, como
acontece classicamente com os vírus simples da herpes e da varicela-zoster.
Segundo Julia Clarke, essa nova replicação está associada à
produção de espécies secundárias de RNA viral, que são resistentes à degradação
e se acumulam nos tecidos.
“A gente observou que, ao voltar a replicar no cérebro, o
vírus gera substâncias intermediárias de RNA e a gente vê um aumento na
predisposição desses animais a apresentarem convulsões, que é um dos sintomas
da fase aguda”, acrescentou.
Em modelos animais, o grupo da UFRJ e outros aplicaram
testes de PCR, microscopia confocal, imunohistoquímica, análises
comportamentais e mostraram que o vírus da zika pode permanecer no corpo por
longos períodos, após a fase aguda da infecção. Em humanos, o material genético
do vírus da zika já foi encontrado em locais como placenta, sêmen, cérebro,
mesmo muitos meses após o desaparecimento dos sintomas.
Ela explica que os resultados mostraram que a amplificação
do RNA viral e a geração de material genético resistente à degradação pioram os
sintomas neurológicos nos animais, principalmente nos machos. Embora a
reativação tardia do vírus da zika ainda não tenha sido investigada em humanos,
os dados sugerem que pacientes expostos ao vírus, no início da vida, devem ser
monitorados a longo prazo e que novos sintomas podem ocorrer. Como próximos
passos, Julia Clarke explica que se aprofundarão nas calcificações cerebrais
provocadas pelo vírus.
“O cérebro exposto ao vírus, tanto de animais quanto de
humanos, desenvolve áreas de lesão características com morte de células e
acúmulo de cálcio - as chamadas calcificações. Nosso grupo pretende
caracterizar se essas áreas de calcificações são os locais onde o vírus
permanece adormecido. Além disso, pretendemos testar um medicamento que diminui
muito o tamanho dessas áreas de calcificação para avaliar se consegue prevenir
essa reativação do vírus”, explica.
Julia Clarke ressalta que a pesquisa é de extrema
importância, pois revela a capacidade do vírus persistir e reativar, o que pode
ter grandes implicações para a saúde pública. O trabalho contou com a
colaboração de pesquisadores do Instituto de Microbiologia Paulo de Góes e do
Instituto de Bioquímica Médica Leopoldo de Meis, ambos da UFRJ, e financiamento
de cerca de R$ 1 milhão da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do
Estado do Rio de Janeiro (Faperj).