r7 -01/12/2021 18:31
Por 18 votos a 9, a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado
aprovou nesta quarta-feira (1º) o nome do ex-advogado-geral da União e
ex-ministro da Justiça e Segurança Pública André
Mendonça para o STF (Supremo Tribunal Federal). A indicação agora vai
ao plenário da Casa, onde precisa de ao menos 41 votos para ser aprovada, em
votação secreta. Ele é o segundo indicado pelo presidente Jair Bolsonaro ao
Supremo — o primeiro é o hoje ministro Kassio Nunes Marques.
No início da sabatina, Mendonça usou o espaço de fala para
fazer um panorama sobre a sua vida, levando informações pessoais e contando
como iniciou a atuação na advocacia. Em seguida, passou a evocar a importância
do posto ao qual foi indicado e a exaltar o regime democrático.
O aprovado na sabatina falou sobre religião e sobre a sua
atuação como pastor, mas garantiu compromisso com o estado laico e a liberdade
de religião. Bolsonaro tinha reiterado anteriormente o desejo de ter um
ministro evangélico.
"Considerando discussões havidas em função de minha
condição religiosa, faz-se importante ressaltar a minha defesa do estado laico.
A Igreja Presbiteriana, a qual eu pertenço, nasceu no contexto da Reforma
Protestante, sendo uma de suas marcas a defesa da separação entre a igreja do
Estado. A laicidade é a neutralidade, a não perseguição e a não concessão de
privilégios por parte do estado em relação a um credo específico ou a um grupo
determinado de pessoas em função da sua função religiosa", afirmou.
O advogado ainda pontuou: "Como tenho dito quanto a mim
mesmo: na vida, a Bíblia; no Supremo, a Constituição Federal. Defenderei a
laicidade estatal e a liberdade religiosa de todo cidadão, inclusive os que não
professam qualquer crença."
Alinhamento com Bolsonaro
O advogado foi amplamente questionado sobre o seu
alinhamento com o presidente Jair Bolsonaro e, ao longo da sessão, buscou
ressaltar sua independência em relação ao Executivo.
"Sempre pautei minha vida pública pelo respeito aos
princípios da administração pública. Não obstante, sei a distinção entre os
papéis de um ministro de Estado e de um ministro do Supremo Tribunal Federal.
Sei que, se aprovado por este Senado Federal, estarei credenciado a assumir o
cargo de juiz da Suprema Corte do nosso país, incumbência que vai muito além de
um governo, abrange a nação como um todo e o seu futuro, exige independência
plena para julgar, de acordo com a Constituição e as leis", afirmou, em
sua fala inicial.
Em seguida, o ministro fez compromissos públicos, sendo o
primeiro "com a democracia e a defesa do Estado democrático de
direito". "O regime democrático tem sido fundamental para se garantir
o pluralismo político, bem como a dignidade da pessoa humana e a convivência
harmoniosa de todos os cidadãos. Assim, reafirmo meu irrestrito compromisso com
o Estado democrático de direito, conforme expresso desde o preâmbulo da nossa
Constituição", disse.
Mendonça afirmou que inclui o compromisso "de respeitar
as instituições democráticas, em especial a independência e a harmonia entre os
poderes da República".
Lei de Segurança Nacional
Mendonça afirmou que "jamais" usou a Lei de
Segurança Nacional "com o intuito de perseguir ou intimidar". O
advogado já foi amplamente criticado pelo uso da lei contra críticos do
presidente Bolsonaro na época em que esteve à frente do Ministério da Justiça e
Segurança Pública. A norma, de 1983, é conhecida como um "entulho da
ditadura militar". Ela foi usada pelo governo antes de ser revogada pelo
Congresso Nacional, no segundo semestre deste ano. A revogação se deu após
atuação dos parlamentares e discussões por parte de ministros do STF.
Diante dos senadores, Mendonça considerou que a revogação da
Lei de Segurança Nacional ocorreu em "boa hora" e disse que, antes
disso, ela estava em pleno rigor. Conforme o advogado, o próprio STF já tinha
usado a legislação em casos concretos, e "não restava ao executor da norma
outra opção senão atuar conforme os seus parâmetros".
"Minha conduta sempre se deu em estrita obediência ao
poder legal e em função do sentimento de ofensa à honra da pessoa ofendida, mas
jamais com intuito de perseguir ou intimidar", defendeu-se Mendonça. O
advogado justificou que a lei previa crime caluniar ou difamar o presidente da
República, "imputando-lhe fato definido como crime ou ofensivo à sua
reputação", e que a apuração do fato se daria mediante requisição do
ministro da Justiça.
"Assim, sentindo-se o presidente ofendido em sua honra
por determinado fato, o que significa análise individual [do presidente], devia
o ministro da Justiça instar a Polícia Federal para apurar o fato, sob pena de,
não o fazendo, incidir em crime de prevarização", afirmou. Quando esteve
no posto de ministro, Mendonça foi criticado por juristas pelo uso apontado
como "exarcebado" da lei, o que gerou reação do Congresso, que passou
a discutir a revogação da lei.
A ministra do STF Cármen Lúcia pediu que Mendonça, no ano
passado, explicasse um dossiê que investigou 579 servidores da área de segurança
pública e professores que integram um movimento contra o governo. Diversas
figuras foram intimadas a depor em inquéritos da Polícia Federal abertos após a
solicitação de Mendonça.
A Lei de Segurança Nacional já tinha tido seis versões, a
primeira delas de 1935 e a última de 1983, antes da Constituição de 1988. Até
sua revogação, seu texto previa como crime caluniar ou difamar os presidentes
da República, do Senado Federal, da Câmara dos Deputados ou do STF; e também
trazia um trecho sobre "incitar a subversão da ordem política ou social e
a luta com violência entre as classes sociais".
Aceno aos senadores
O ex-ministro da Justiça afirmou que o instituto da delação
premiada não pode ser usado como prova contra qualquer pessoa. "Delação
premiada não é elemento de prova. Eu não posso basear uma conviccção com base
em uma delação. Delação não é acusação. Entendo que o combate à corrupção tem
que ser feito respeitando garantias e direitos individuais. Os fins não
justificam os meios. Precisamos respeitar a política", afirmou.
A fala é uma sinalização positiva aos senadores que, em sua
maioria, são críticos à delação premiada, amplamente usada pela operação Lava
Jato. Mendonça ressaltou que todos são contra a corrupção, mas que não se pode
criminalizar a política, pontuando que "as generalizações são
péssimas" e que não se pode aceitar pré-julgamentos.
O advogado ainda frisou a contrariedade de que o Supremo
analise a prisão após condenação em segunda instância sem que a Corte seja
provocada pelo Congresso. "Se voltar ao Supremo a rediscussão sem uma
alteração inovadora e concreta levada por parte do Congresso, da minha parte
não terá consonância dentro desse contexto. Não podemos ter uma decisão de um
jeito e depois de outro jeito. Precisamos de estabilidade", afirmou.
A fala também dialoga de forma positiva com o Congresso. Em
2019, o Supremo voltou a proibir prisão após condenação em segunda instância
judicial, o que permite a prisão somente após o processo ter transitado em
todas as instâncias. A decisão foi bem vista pela classe política, tendo em
vista que passou a impedir a prisão de políticos condenados sem que os
processos tivessem transitado em julgado. Após a decisão, o ex-presidente da
República Luiz Inácio Lula da Silva foi solto.
Armas
Durante a sabatina, o advogado afirmou que ainda há espaço
para posse e porte de arma. A questão da liberação de armas a civis é uma das
grandes bandeiras do presidente Jair Bolsonaro, amplamente publicizada durante
a campanha presidencial de 2018. "Sobre a política de desarmamento,
logicamente, há espaço para posse e porte de arma. A questão que deve ser
debatida é: quais os limites? Até que ponto? Até que extensão?",
questionou.
Mendonça não quis detalhar sua posição, sob a justificativa
de que os decretos de Bolsonaro foram levados à discussão do Supremo, e que
emitir opinião pode torná-lo impedido. "Não posso me manifestar sobre a
exatidão da possibilidade ou não ou da constitucionalidade ou não do tratamento
que foi dado pelos decretos e por atos também legislativos que tratam da
matéria", afirmou.
Há um julgamento em curso no STF de ações que questionam
decretos editados por Bolsonaro que facilitam a aquisição de armas. Parte dos
decretos já foi suspensa após decisões liminares de ministros, mas outra parte
continua valendo. O julgamento foi suspenso em setembro, após pedido de vistas
do ministro Kassio Nunes Marques, indicado por Bolsonaro ao Supremo. Na
ocasião, havia três de 10 votos pela suspensão dos decretos.
Demora
A indicação de Mendonça foi feita em julho, mas ficou
travada na CCJ pelo presidente Davi Alcolumbre (DEM-AP). O ex-ministro
visitou, durante esse período, os senadores
em diversos momentos, e falava com muitos, diariamente, na tentativa
de emplacar o seu nome. Diante do cenário, o presidente do Senado, Rodrigo
Pacheco (PSD-MG), confirmou que entre os dias 30 de novembro e 2 de
dezembro haveria um esforço concentrado para votar a indicação de nomes de
autoridades.
PEDRO FRANÇA/AGÊNCIA SENADO - 24.11.2021
Ainda
assim, Alcolumbre não confirmava Mendonça na pauta, mas deu uma boa
sinalização quando indicou a senadora evangélica Eliziane Gama (Cidadania-MA)
como relatora.
A demora na realização da sabatina vinha incomodando o
Palácio do Planalto, mas Bolsonaro evitava se posicionar de forma contundente
sobre a questão para evitar derrota. Na última terça-feira (30), em filiação ao
PL (Partido Liberal), Bolsonaro afirmou esperar
que a indicação fosse aprovada pelo Senado, mas lembrou que ele apenas
indica e que cabe à Casa definir ou não a aprovação do nome do futuro ministro.
"Sabemos que tem um debate ideológico. Mas ele conversou com todos os
senadores, falou o que ele pretende fazer depois que for escolhido
ministro", disse.