Redação -02/10/2020 22:31
Em decisão divulgada nesta sexta-feira 2, a promotora de Justiça
da 9ª Zona Eleitoral, Rúbia Motizuki, pede a impugnação definitiva e com base na
Lei da Ficha Limpa, da candidatura a prefeito por Andradina do empresário Mário
Celso Lopes [PSDB], que tem como vice o médico Paulo Assis [PV].
O pedido já foi encaminhado à juíza eleitoral local, mas
segundo o coordenador da campanha tucana, Mário Celso já foi notificado e impetrou
recurso contra a solicitação e espera ter o registro de sua candidatura para
continuar na disputa contra seu principal rival, Jamil Ono, do Podemos.
VEJA A DECISÃO DA PROMOTORA
O MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, por
meio do seu agente signatário, vem,
respeitosamente, no uso de suas atribuições
legais, com fulcro no art. 127 da Constituição Federal, bem como no art. 3º da
Lei Complementar nº 64/1990 c/c art. 32, III, da Lei nº 8.625/1993, propor
AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE
REGISTRO DE CANDIDATURA
em face de Mário Celso Lopes, já
devidamente qualificado(a) nos autos do processo em epígrafe
(RCand), candidato(a) a Prefeito no município
de Andradina/SP, pelo Partido da Social Democracia
Brasileira - PSDB, com o nº 45, ante as
razões de fato e de direito a seguir articuladas.
I – DOS FATOS
O(a) requerido(a) Mário Celso Lopes pleiteou,
perante a Justiça Eleitoral, registro de
candidatura ao cargo de Prefeito pelo Partido
da Social Democracia Brasileira - PSDB, após regular
escolha em convenção partidária, conforme edital
publicado.
No entanto, o(a) requerido(a) encontra-se
inelegível, haja vista que foi condenado(a), em
decisão proferida pela Sétima Vara Criminal
da Justiça Federal na Circunscrição Judiciária de Cuiabá/MT, pela prática do
delito de redução à condição análoga a de escravo – (artigo 149 do Código Penal
Brasileiro), à pena de a seis anos, quatro meses e 15 dias de reclusão, além do
pagamento de 240 dias-multa, fixadas no valor de cinco salários mínimos
vigentes à época dos fatos para cada dia-multa1.
Não se tem notícia se houve
recurso contra a decisão proferida e em que fase encontra-se o processo,
porquanto, a despeito de o impugnado possuir negócios e relações jurídicas em
outros Estados da Federação, apresentou tão somente certidões criminais das Justiças
Estadual e Federal no estado de São Paulo para solicitar sua candidatura
perante a
Justiça Eleitoral.
Assim, este Parquet entendeu por bem
ajuizar a presente ação de impugnação, a fim de evitar eventual decurso do
prazo legal. Como se vê da análise das informações recebidas, referida decisão
condenatória foi publicada em 14 de julho de 2017 e, diante do lapso temporal
decorrido, ao certo encontra-se com trânsito em julgado, ou sob a apreciação do
Superior Tribunal de Justiça/Supremo Tribunal Federal. Contudo, como já
decidido reiteradamente e pelo TSE, [o] fato de inexistir trânsito em julgado
não socorre o agravante, pois a LC nº 135/2010 (Lei da Ficha Limpa), cuja
constitucionalidade foi reconhecida pelo STF nas ADCs nº 29 e 30/DF, prevê que
basta o advento de decisão criminal condenatória por órgão judicial colegiado
para a incidência da apontada
Inelegibilidade (Agravo Regimental em Recurso
Ordinário nº 060069278/MS – Acórdão de
12.12.2018 – Relator Min. Tarcisio Vieira de
Carvalho Neto).
Assim, o(a) requerido(a) é
inelegível, nos termos do art. 14, § 9º, da Constituição
Federal c/c o art. 1º,
inciso I, alínea “e”, da LC nº 64/1990, com a redação da LC nº 135/2010 (Lei da
Ficha Limpa), conforme a seguir:
Art. 1º São inelegíveis:
I - para qualquer cargo:
[...]
e) os que forem condenados, em decisão
transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, desde a
condenação até o transcurso do prazo de 8 (oito) anos após o cumprimento da
pena, pelos crimes: (Redação dada pela Lei Complementar nº 135, de 2010) 1.
contra a economia popular, a fé pública, a administração pública e o patrimônio
público; (Incluído pela Lei complementar nº 135, de 2010)
2. contra o patrimônio privado, o sistema
financeiro, o mercado de capitais e os previstos na lei que regula a falência;
(Incluído pela Lei Complementar nº 135, de 2010)
3. contra o meio ambiente e a saúde pública;
(Incluído pela Lei Complementar nº 135, de 2010)
4. eleitorais, para os quais a lei comine
pena privativa de liberdade; (Incluído pela
Lei Complementar nº 135, de 2010)
5. de abuso de autoridade, nos casos em que
houver condenação à perda do cargo
ou à inabilitação para o exercício de função
pública; (Incluído pela Lei Complementar nº 135, de 2010)
6. de lavagem ou ocultação de bens, direitos
e valores; (Incluído pela Lei Complementar nº 135, de 2010)
7. de tráfico de entorpecentes e drogas
afins, racismo, tortura, terrorismo e hediondos; (Incluído pela Lei
Complementar nº 135, de 2010)
8. de redução à condição análoga à de
escravo; (Incluído pela Lei Complementar nº 135, de 2010)
9. contra a vida e a dignidade sexual; e
(Incluído pela Lei Complementar nº 135, de
2010)
10. praticados por organização criminosa,
quadrilha ou bando; (Incluído pela Lei Complementar nº 135, de 2010)
§ 4º A inelegibilidade prevista na alínea e
do inciso I deste artigo não se aplica aos crimes culposos e àqueles definidos
em lei como de menor potencial ofensivo, nem aos crimes de ação penal privada. No
caso em tela, reitera-se que, embora a pena imposta não tenha sido sequer
iniciada, o(a) impugnado(a) está inelegível
tendo em vista que [a] inelegibilidade prevista no art. 1°, I, e, 1, da
LC n° 64/90 decorre de condenação criminal com trânsito em julgado ou proferida
por órgão colegiado, pela prática de crime contra a Administração Pública, e se
estende desde a condenação até oito anos após o cumprimento da pena (TSE –
Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 5654/PR – Acórdão de 16/05/2017
– Relator Min. Napoleão Nunes Maia Filho).
Com efeito, “[o] prazo concernente à
hipótese de inelegibilidade prevista no art. 1º, I, e, da LC nº 64/90
projeta-se por oito anos após o cumprimento da pena, seja ela privativa de
liberdade,
restritiva de direito ou
multa” (Súmula-TSE
nº 61).
Portanto, evidente que ainda não transcorreu
o prazo de 8 (oito) anos desde a condenação colegiada e, muito menos, após o
cumprimento ou extinção da pena, razão pela qual o(a)
requerido(a) encontra-se inelegível. No caso
em tela, deve-se observar que o crime pelo qual o(a) requerido(a) foi condenado(a)
por decisão proferida por órgão colegiado não é de menor potencial ofensivo,
nem culposo e tampouco de ação penal privada, o que afasta a incidência da
exclusão de inelegibilidade prevista no § 4º do art. 1º da LC nº 64/1990.
II – DA APLICAÇÃO DA LC Nº
135/2010 (LEI DA FICHA LIMPA) A FATOS ANTERIORES A SUA
ENTRADA EM VIGOR
A inelegibilidade não possui natureza
jurídica de pena/sanção, mas se trata apenas de um requisito, ou seja, uma
condição, para que o cidadão possa ocupar cargos eletivos da maior relevância
para a sociedade, visando proteger e
assegurar a própria legitimidade do sistema democrático e a
probidade administrativa, nos termos do art.
14, § 9º, da Constituição Federal2. Além disso, as condições de elegibilidade e as causas de
inelegibilidade devem ser feridas no momento da formalização do pedido de
registro da candidatura (art. 11, § 10º, da Lei nº 9.504/1997).
Assim, as hipóteses de inelegibilidade
previstas na LC nº 135/2010 são aferidas no momento do registro de candidatura,
aplicando-se inclusive às situações configuradas antes de sua entrada em vigor.
Não se trata de dar aplicação retroativa à lei, porquanto essa está sendo
aplicada em registros de candidaturas posteriores à sua entrada em vigor e não
a registros de candidatura passados.
Nesse sentido, o STF decidiu
no julgamento das ADCs nºs 29 e 30, rel. Min. LUIZ FUX, com efeito erga
omnes e eficácia vinculante, que é constitucional a aplicação das hipóteses
de inelegibilidade previstas
na LC nº 135/2010 (Lei da Ficha Limpa) a fatos anteriores à sua entrada em
vigor.
Confira-se:
[...] A elegibilidade é a adequação do
indivíduo ao regime jurídico – constitucional e legal complementar – do
processo eleitoral, razão pela qual a aplicação da Lei Complementar nº 135/10
com a consideração de fatos anteriores não pode ser capitulada na
retroatividade vedada pelo art. 5º, XXXVI, da Constituição, mercê de incabível
a invocação de direito adquirido ou de autoridade da coisa julgada (que opera
sob o pálio da cláusula rebus sic stantibus) anteriormente ao pleito em oposição
ao diploma legal retromencionado; subjaz a mera adequação ao sistema
normativo pretérito (expectativa de direito).
[…] (STF – ADC 29, Relator: Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em
16.2.2012, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-127 DIVULG 28.6.2012 PUBLIC 29.6.2012 RTJ VOL-00221-01
PP-00011) O referido entendimento foi reafirmado pelo STF no julgamento do AgR
no RE nº 1028574/SC, rel. Min. EDSON FACHIN, 2ª Turma, j. 19.6.2017, DJe de
31.7.2017; e no RE-RG nº 929.670/DF, red. para acórdão Min. LUIZ FUX, Plenário,
j. 4.10.2017, sendo que nesse último precedente assentou-se que a tese jurídica
firmada na ADC nº 29/DF é aplicável inclusive na hipótese da alínea “d” do inciso
I do art. 1º da LC nº 64/90, não havendo ofensa à coisa julgada.
Na mesma esteira, é pacífica a jurisprudência
do TSE sobre o tema, conforme se infere
dos seguintes precedentes: RECURSO ORDINÁRIO.
REGISTRO DE CANDIDATURA. INELEGIBILIDADE. CONDENAÇÃO CRIMINAL.
CONSTITUCIONALIDADE DA LEI COMPLEMENTAR Nº 135/2010. ART. 1º, I, E, DA LEI
COMPLEMENTAR Nº 64/90.
CARACTERIZAÇÃO. 1. No julgamento das ADCs
29 e 30 e da ADI 4.578, o STF assentou que a aplicação das causas de inelegibilidade
instituídas ou alteradas pela LC nº 135/2010 a fatos anteriores à sua vigência
não viola a Constituição Federal. 2. Por ter o agravante sido condenado por decisão transitada em julgado,
pela prática do crime de tráfico de entorpecentes e drogas afins, cuja pena
privativa de liberdade foi extinta pelo integral cumprimento da pena
em 8.3.2010, está ele inelegível nos termos do art. 1º, I, e, 7, da LC
nº 64/90.
Agravo regimental a que se nega provimento. (TSE
– Agravo Regimental em Recurso Ordinário nº 27434, Acórdão de 23/09/2014,
Relator(a) Min. HENRIQUE NEVES DA SILVA, Publicação: PSESS – Publicado em
Sessão, Data 23/09/2014)
[...] 1. Na linha das jurisprudências do
Supremo Tribunal Federal e desta Corte, as novas causas de inelegibilidade,
instituídas ou alteradas pela LC nº 135/2010, devem ser aferidas no momento do
pedido de registro de candidatura, considerando inclusive fatos anteriores à
edição desse diploma legal, o que não implica ofensa aos princípios da
irretroatividade das leis e da segurança jurídica. […]
(TSE – Recurso Especial Eleitoral nº 2502,
Acórdão de 14/05/2013, Relator Min. MARCO AURÉLIO MENDES DE FARIAS MELLO,
Relatora designada Min. LAURITA HILÁRIO VAZ, Publicação: DJE – Diário de
justiça eletrônico, Tomo 203, Data 22.10.2013, Página 55) Destarte, as causas
de inelegibilidades instituídas ou alteradas pela LC nº 135/2010 aplicam-se a
fatos anteriores à sua vigência, encontrando-se o(a) requerido(a) atualmente
inelegível por força do disposto art. 1º, inciso I, alínea “e”, da Lei
Complementar nº 64/90.
III – PEDIDO
Ante o exposto, o Ministério Público
Eleitoral requer:
a) seja o(a) requerido(a)
citado(a) no endereço constante do seu pedido de registro para
apresentar defesa, se quiser, no prazo legal,
nos termos do art. 4º da LC nº 64/1990 e do art. 41, caput, da Res.-TSE
nº 23.609/2019;
b) requer, nos termos do art.
3º, § 3º, da LC nº 64/1990, a produção das seguintes provas: (b.1) a
juntada dos documentos em anexo (informação Sisconta); (b.2) seja expedido
ofício ao Meritíssimo Magistrado da Sétima Vara Criminal Federal da Seção
Judiciária de Cuiabá/MT requisitando o encaminhamento de certidão criminal
narrativa do (s) processo (s) envolvendo o candidato Mário Celso Lopes,
portador do CPF 704.912.248-34, assim como cópia da
respectiva sentença ou
acórdão penal condenatório; e (b.3) Expedição de ofícios às justiças estadual e federal dos
estados do Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Rondônia e Tocantins, solicitando o
encaminhamento das certidões criminais do que constar em nome do impugnado.
c) após o regular trâmite
processual, seja indeferido em caráter definitivo o pedido de registro
de candidatura do(a) requerido(a).
Andradina, 02 de outubro de 2020.
RÚBIA PRADO MOTIZUKI - Promotora de Justiça da -9ª Zona Eleitoral [texto editado às 22h35]
Coordenador da campanha disse que Mário Celso só se manifestará após decisão da Justiça Eleitoral