vg noticias -15/11/2022 21:07
A morte foi confirmada pelo presidente
do MDB, Baleia Rossi, no Twitter. Ele prestou condolências aos amigos e
familiares e lembrou que Fleury Filho foi membro da Comitiva Estadual do
partido. A causa da morte não foi divulgada.
Fleury formou-se em 1968 na Academia do
Barro Branco, da Polícia Militar, na mesma turma do futuro comandante da Rondas
Ostensivas Tobias de Aguiar (Rota) Antonio Chiari e do procurador de Justiça
Antonio Ferreira Pinto. Ele e Ferreira deixariam a PM em momentos distintos –
Fleury ainda tenente e Ferreira já capitão – depois de passaram no concurso
para o Ministério Público Estadual.
No MPE, Fleury atuava na Associação
Paulista do Ministério Público quando foi escolhido pelo governador Orestes
Quércia para ser seu secretário da Segurança Pública. Na sua gestão foi criado
o rádio patrulhamento padrão.
A decisão de fazê-lo governador era uma aposta de
Quércia para manter o governo do Estado nas mãos do MDB e enfrentar seu
principal adversário, o ex-governador Paulo Maluf (PP), cujo discurso era
fortemente vinculado à segurança pública. O MDB governava São Paulo desde 1983.
Mas sofrera uma dissidência dois anos antes, com a saída de parte de suas
lideranças, que fundaram o PSDB, o que abriu caminho para Fleury.
Tudo começou em 1986, quando seus principais
líderes entraram em choque. Quércia era então vice-governador e conseguiu se
impor como candidato do partido ao governo do Estado por meio da rede de
prefeitos que ele atraiu para a legenda. O domínio da máquina emparedou Franco
Montoro, então titular do Palácio dos Bandeirantes. O padrinho de Fleury
acabaria eleito assim como os candidatos ao senador da legenda: Mário Covas e
Fernando Henrique Cardoso. Os dois e Montoro se haviam mudado para o PSDB.
Covas seria adversário de Fleury na disputa e terminaria em terceiro.
Na esteira da popularidade de Quércia no interior e
no anti-malufismo, Fleury foi disputar o segundo turno da eleição com Maluf.
Ganhou ainda o apoio do recém-eleito senador Eduardo Suplicy (PT). A frente
montada contra Maluf conseguiu o que parecia improvável: virar uma eleição em
que seu adversário havia recebido 43,5%% dos votos no primeiro turno e ele, 28%
– o segundo turno terminaria com 51% dos votos para Fleury. Seu vice era
Aloysio Nunes Ferreira. Foi a última vez que o MDB ganhou uma eleição em São
Paulo.
Fleury buscou manter a mesma fórmula que levara à
sua eleição. Escolheu para o cargo de secretário da Segurança o amigo e também
promotor de Justiça Pedro Franco de Campos. Nomeou ainda outros promotores para
cargos no governo, criando a chamada República dos Promotores. Já governador,
repetia que a “Rota iria para a rua”, apropriando-se, assim, da frase repetida
pelo seu adversário, Paulo Maluf.
Em 1991, comprou uma centena de viaturas para a
Rota e discursou no pátio da unidade, pedindo uma ação dura contra o crime. O
resultado foi imediato. Em 1990, a PM matou 580 pessoas em tiroteios no estado.
Em 1991, esse número subiu para 1.056 e em 1992, o total de mortos chegaria ao
recorde de todos os tempos: 1.421.
Foi nesse ano que ocorreu o evento que marcou
Fleury até o fim: o massacre da Casa de Detenção. Era 2 de outubro de 1992,
véspera do primeiro turno da eleição para prefeitos, quando uma briga de presos
no Pavilhão 9 da Casa de Detenção iniciou uma rebelião no lugar. A Tropa de
Choque da PM foi chamada, mas em vez de escudeiros e policiais com armas não
letais, o comandante da operação, coronel Ubiratan Guimarães determinou que
homens de unidades de elite, armados com submetralhadoras e fuzis, retomassem o
pavilhão. A operação policial matou 111 presos, segundo a perícia, sem que
houvesse prova de que os detentos atiraram nos policiais.
A crise que se seguiu levou ao afastamento de
Ubiratan e de todos os coronéis envolvidos no caso – cinco. Entre eles, Chiari,
seu colega de turma. Além de um capitão. A medida não foi suficiente e, cinco
dias depois do massacre, Pedro Franco de Campos, o pupilo de Fleury, foi
afastado da secretaria.
Fleury sempre negou ter dado a ordem para a PM
invadir. Assumiu a responsabilidade política, enquanto a criminal ficou com os
policiais – 74 deles foram condenados e aguardam o julgamento de um último
recurso no Superior Tribunal de Justiça. Com a queda de Campos, Fleury não
conseguiu ninguém que pudesse sucedê-lo. Seu vice, Aloysio Nunes Ferreira,
havia sido derrotado na eleição para prefeito de São Paulo.
Fleury deixou o governo do Estado e viu boa parte
de seus antigos aliados – como Aloysio e o futuro governador Alberto Goldman –
deixarem o MDB em direção ao PSDB. Ele mesmo deixaria o partido e passaria pelo
PPS e pelo PTB antes de retornar ao MDB.
Vinte anos depois do massacre, ele falou ao Estadão sobre
o caso: “Logo depois que o coronel Ubiratan (Guimarães) entra e controla o
térreo, explode uma tela de televisão na cabeça dele. Ele perde os sentidos,
desmaia e aí deixa de haver comando.” E lembrou que no pavilhão estavam mais de
2 mil presos. “Quem não resistiu está vivo.”
Fleury afirmou acreditar que o episódio não afetou
sua popularidade. “Mas politicamente me atingiu. Esqueceram todo o meu passado
e eu passei a ser considerado como alguém que não tem outras qualidades e
tivesse adotado atitudes quase de genocídio, o que não é verdade. Eu recebo
ameaças até hoje.”
Desde o ano passado, os amigos relatavam a piora de
seu estado de saúde – ele sofria com um câncer.