folhapress -20/11/2019 19:07
A PEC (proposta de emenda à
Constituição) que permite prisão após condenação em segunda instância foi
aprovada nesta quarta-feira (20) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da
Câmara, apesar de tentativas de obstrução da oposição e da falta de articulação
do governo.
A CCJ analisou a
constitucionalidade do texto, que agora vai a uma comissão especial, ainda
a ser instalada, para debater o mérito.
A proposta, de autoria do
deputado federal Alex Manente (Cidadania-SP), foi aprovada por 50 votos a favor
e 12 contrários, de um total de 62 deputados que votaram - a comissão tem 66
titulares.
Deputados apoiadores da Operação
Lava Jato intensificaram os esforços para tentar aprovar mudanças na lei após o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ser solto, no último dia 8.
A libertação ocorreu porque o STF
(Supremo Tribunal Federal) decidiu que condenados em segunda instância não
podem começar a cumprir suas penas antes que se esgotem todos os recursos.
Para aprovar o texto na CCJ, o
governo teve de acatar alterações na proposta original. A PEC inicialmente
mexia no inciso 57 do artigo 5º da Constituição, que diz que ninguém será
considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória -
no entendimento de hoje, até que acabem todas as possibilidades de recurso e
que a sentença se torne definitiva.
Pelo texto da PEC original de
Manente, ninguém seria considerado culpado até a confirmação de sentença penal
condenatória em grau de recurso - ou seja, a prisão já valeria após condenação
em segunda instância.
O artigo 5º, no entanto, é uma
das cláusulas pétreas da Constituição - ou seja, não poderia ser modificado,
nem mesmo por emenda. Era justamente esse o entrave à votação do texto na
comissão.
A solução encontrada por Manente
na semana passada foi sugerir uma nova PEC com alterações nos artigos 102 e 105
da Constituição, itens que dispõem, respectivamente, sobre o STF e o STJ
(Superior Tribunal de Justiça).
O texto foi protocolado na noite
de terça-feira (19) e teve 187 assinaturas conferidas - eram necessárias pelo
menos 171. Desta forma, a nova PEC foi apensada à anterior.
A nova proposta de Manente acaba
com os recursos extraordinários (STF) e especiais (STJ) e os substitui pelas
ações revisionais extraordinárias e especiais, que permitem revisões apenas por
erros.
O entendimento do deputado é que
recursos extraordinários e especiais são protelatórios. Com o esgotamento dos
recursos ordinários, as decisões em segunda instância transitariam em julgado.
Na semana passada, durante a
discussão do tema, havia a expectativa de que, assim que a nova PEC fosse
apensada, a relatora da proposta original, deputada Caroline de Toni (PSL-SC),
faria complementação de voto pela admissibilidade do novo texto e rejeitaria as
mudanças na cláusula pétrea.
Dessa forma, seria possível
driblar a resistência de parlamentares que viam inconstitucionalidade na
proposta inicial. Não foi o que aconteceu. Carol de Toni decidiu inicialmente
manter também a admissibilidade da proposta de alteração no artigo 5º, gerando
reações de parlamentares.
O deputado Lafayette de Andrada
(Republicanos-MG) afirmou ser favorável ao texto da segunda PEC, mas disse
discordar da aprovação da primeira por se tratar de cláusula pétrea. "As
emendas 410 e 411 [do então deputado Onyx Lorenzoni, apensada à 410] modificam
o artigo 5º da presunção de inocência. Confesso que tenho grande dificuldade de
votar isso", disse.
"Somos favoráveis à prisão
em segunda instância, e uma maneira eficaz de atingir a prisão em segunda
instância é justamente mexendo nos recursos extraordinários e especiais, que
estão apresentados na emenda 199".
Com a reação contrária de
potenciais aliados, a presidência da CCJ, exercida no momento pela deputada Bia
Kicis (PSL-DF), decidiu suspender a sessão às 13h38 por meia hora para que
Carol de Toni refizesse seu voto e retirasse o trecho que tratava da cláusula
pétrea. Isso abriu caminho para a aprovação do texto que trata apenas
dos artigos 102 e 105 da Constituição.
"Reconheço que a PEC 199/2019
apresenta solução ainda mais assertiva que as demais, porque a um só tempo
inibe a interposição de recursos meramente protelatórios e desafoga a carga de
trabalho da suprema corte", concluiu Carol de Toni, rejeitando, enfim, as
propostas que mexiam em cláusulas pétreas.
A mudança também buscou contornar
um eventual conflito com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que
defendia uma solução à prisão em segunda instância que oferecesse maior
segurança jurídica, incluindo a negociada no Senado.
Lá, o presidente da
Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), defende que a alteração seja feita no
Código de Processo Penal.
"Qualquer solução vai
judicializar e vão ser mais um ou dois anos com a mesma polêmica. Então é
melhor uma solução definitiva, mesmo que possa atrasar uma, duas ou três
semanas", disse Maia nesta quarta.
Apesar de ter sido solto após a
decisão do STF, Lula segue enquadrado na Lei da Ficha Limpa, impedido de
disputar eleições. O ex-presidente foi condenado em três graus da Justiça sob a
acusação de aceitar a propriedade de um tríplex, em Guarujá, como propina paga
pela empreiteira OAS em troca de contrato com a Petrobras, o que ele sempre
negou.
A pena do ex-presidente foi
definida pelo STJ em 8 anos, 10 meses e 20 dias, mas o caso ainda tem recursos
pendentes nessa instância e, depois, pode ainda ser remetido para o STF.