r7 -05/04/2021 00:19
Em meio ao cenário de incerteza causado pela segunda
onda da pandemia de covid-19 no Brasil, economistas defendem que
somente ações coordenadas, que combinem medidas de curto, médio e longo prazos
garantem o estancamento da fome
e da miséria, problemas crescentes que acompanham o recrudescimento da
tragédia sanitária.
Entrevistados pelo R7, os especialistas são unânimes ao
dizer que a melhor condução do país na pandemia seria o primeiro passo para
diminuir os efeitos econômicos das quarentenas. Porém, com a falha nacional
para conter a doença que já mata
quase 4 mil pessoas por dia, os comércios e serviços voltaram a fechar, e
planos de retomada econômica foram mais uma vez adiados.
Com isso, a fila extensa de brasileiros desempregados (pouco
mais de 13 milhões), na informalidade do mercado de trabalho (40 milhões), ou
em situação de extrema insegurança alimentar (10 milhões) deve ser engrossada
nos próximos meses, explica a economista do Insper, Juliana Azinhazs.
"O cenário, tanto no macro quanto no micro, é muito
perverso. E óbvio que isso tudo impacta muito a locação de recursos de curto,
médio e longo prazos. Estamos falando de uma sociedade que, no limite, vai
consumir menos e que já passa hoje por uma mudança de perfil. A piora social
está em cima da mesa e é inevitável", argumenta.
Segundo os especialistas, nem mesmo programas do tamanho do
auxílio emergencial, que somadas suas duas versões deve transferir mais de 400
bilhões para cerca de 64 milhões de brasileiros, podem segurar mais o cenário
geral ruim de endividamento público, inflação e
incerteza.
"O fato de você somente entregar dinheiro não confere
um grande ganho no longo prazo. O que se fez foi a maneira mais fácil e mais
preguiçosa de fazer a economia não parar. Na verdade tínhamos que trabalhar
para manter a saúde financeira de pequenas e médias empresas para não
quebrarem, e isso o governo fez de forma muito tímida", critica o
professor de Relações Institucionais e Governamentais do Mackenzie, Márcio
Coimbra.
Endividamento público
O Brasil teve o problema fiscal piorado pela chegada de
novas dívidas com a pandemia, atingindo mais de R$ 5,01 trilhões de Dívida
Pública Federal ao final de 2020. O Orçamento de 2021, aprovado às pressas,
gerou protestos da própria equipe econômica do governo Bolsonaro, que não
vê possibilidades do texto atual ser executado, de tão baixos que são os
valores.
Até mesmo o Congresso já
admite alterar a proposta recém-aprovada, sob alertas da IFI (Instituição
Fiscal Independente) do Senado Federal de que as verbas previstas não serão
necessárias nem para gastos básicos, como o da Previdência, além de pedaladas
fiscais nas propostas.
Para o professor da FGV (Fundação Getúlio Vargas), Mauro
Rochlin, a visão de curto prazo e o que classificou de "negacionismo"
da equipe econômica desde 2020 foi determinante para que o orçamento seja
insuficiente agora.
"O governo insistiu em negar que poderia se agravar a
pandemia. Achou que estava resolvido o problema e estamos vendo que não está, é
o contrário e é muito mais grave agora. Paulo Guedes e equipe não preparam um
orçamento e um planejamento para fazer face a essa situação em que a pandemia
ainda está presente", afirmou.
Neste cenário em que Brasil ainda tenta passar pela sua fase
mais dramática da pandemia e os gastos não podem ser contidos, seja com o
auxílio, vacinas ou leitos de UTI (Unidade de Terapia Intensiva), o aumento da
dívida não deve ser encarado necessariamente de forma negativa, de acordo com o
professor da UFABC (Universidade Federal do ABC), Fábio Terra.
"O que mais importa não é o nível absoluto da relação
entre dívida pública e o PIB [Produto Interno Bruto]. É a maneira pela qual o
governo mostra que equalizará essa relação ao longo do tempo, que sabe do nível
do problema e demonstre como controlará esta questão", pontuou.
Reformas
Para garantir investimentos públicos e a normalização das
contas públicas em um período com a pandemia controlada, sem o surgimento de
novos gastos emergenciais, os economistas entrevistados pelo R7 citam
a reforma
tributária como uma das medidas mais urgentes e que poderiam fazer
frente ao desafio fiscal brasileiro.
"A reforma tributária, muito mais para a conta pública,
é necessária para reduzir os custos tributários de produção no país e para
reduzir desigualdades. Nosso sistema tributário, além de absolutamente ineficiente,
é desigual", diz Fábio Terra.
Para o coordenador da Comissão de Política Econômica do
Cofecon (Conselho Federal de Economia), Fernando Aquino, uma das prioridades
também devem ser os investimentos do governo logo após o controle da pandemia.
"A gente está com a economia ociosa. O governo
gastando, vai estimular a economia, aumentando o emprego e as vendas. É o que
os EUA estão fazendo, aprovando planos fabulosos de incentivo, que não víamos
desde a 2ª Guerra Mundial", argumenta.
Já Mauro Rochlin considera fundamental o controle das
contas. "Eu creditaria toda a
alta do dólar, de R$ 4,10 antes da pandemia a este patamar de agora, de R$
5,70, como reflexo de uma fragilidade fiscal. A inflação hoje é mais alta por
causa do câmbio, e a taxa de juros também tem que acompanhar essa alta. Os
juros maiores têm impacto negativos no PIB e no emprego", explica.
Em comum os especialistas avaliam que a solução completa do
mix de problemas da economia brasileira passa pela definição de uma agenda
econômica, aliada à estabilidade política, à responsabilidade fiscal e ao
controle da inflação.
"A solução para o Brasil passa por reformas estruturais
que, feitas de uma forma séria, devem demorar pelo menos uma década para que a
economia entre em uma trajetória positiva e sustentável. A gente não está
falando de um resultado definitivo para 2022 ou 2023, e sim para 2028 ou até
mais", finaliza Azinhazs.